segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Conto de mar

Dora Brisa

Que saco!
Nem isso você vê?
Estou abandonando o barco.
Finalmente, consegui meu brevê.

Quero voar, voar,
Voar além do teu céu,
Muito além do teu mar.
E que meu adeus seja o escarcéu.

Abandono o teu barco,
Antes de tudo afundar.
Levo comigo o meu arco,
Porque a flecha pego no ar.

Só você não vê
Que a cena é derradeira:
Gran finale fora da tevê,
Comédia mexicana de primeira.

Você não leva a sério,
Mas do teu barco já saí.
Grito todo tipo de impropério:
Não volto, nem se você pedir.

Você não me ouve mais?
Já sei, ficou surdo, retardado.
Permaneço ajoelhada no cais.
Ao longe, você parece aliviado.

Metódico, solta o barco ao mar,
Sem olhar para trás,
Enquanto levanto devagar,
Aceno, grito todos os meus ais.

Você segue irredutível
A navegar pelo teu mar.
Teu silêncio é compreensível
Para mim, que fico a chorar.

Não, não fui eu que abandonei
O barco que continua a velejar.
Foi você que esqueceu (nunca pensei)
Essa que, agora com brevê, não quer mais voar.

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