Dora
Brisa
Vem
ver,
Moço,
Vem
conhecer a minha rua.
Tá
vendo aquele casarão?
Lá,
mora a viúva que
Serve
feijoada pra gente,
Todos
os sábados, no portão.
Ninguém
por aqui
Conheceu
o falecido.
Nessas
casas ao lado,
Moço,
Vivem
famílias inteiras,
Com
pais, filhos, avós,
Até
gato, cachorro e papagaio.
Adiante,
ficam a padaria,
A
farmácia e o botequim.
No
outro lado da rua,
Estão
o açougue e o mercadinho,
Que
são do mesmo português.
Por
esses pedregulhos,
Moço,
Passa
a alegria da
Criançada
na rua:
Carrocinhas
de sorvete,
Pipoca,
até pamonha,
Algodão-doce,
pé de moleque.
No
terreno baldio, logo ali,
Circo
e parque de diversões
Acampam
quase o ano todo.
Na
minha rua,
Moço,
Conserta-se
guarda-chuvas,
Amola-se
facas e tesouras,
Vende-se
pães feitos em forno de barro.
A
minha rua tem muito mais:
Tem
feira livre.
Tem
música no coreto da praça,
Com
bandinha militar,
Todo
domingo, depois da missa.
A
igrejinha fica lá,
Atrás
do chafariz,
No
centro da praça de tamarindos,
Mangas,
cajus e outros frutos.
Olha
só,
Moço,
Como
a minha rua tem cores,
Nas
portas e janelas abertas,
Nas
casas rodeadas de jardins
Sem
grades, sem muros.
Naquela
barraquinha na praça,
Fica
a biblioteca improvisada.
O
povo da minha rua gosta de ler.
Final
de semana inteirinho,
Moço,
Todo
mundo se acomoda por aqui mesmo,
Os
que lêem e os que escutam.
Ainda
tem gente que canta,
Toca
uma viola, conta causo.
Essa
é a minha rua,
Moço,
Que
parece pequena, estreita,
Mas
é maior que o mundo.
Aonde
eu moro?
Qual
dessas é a minha casa?
Não
tenho casa, não,
Moço.
Com
uma rua dessas,
Eu
não preciso de mais nada.
Se
eu tivesse uma casa,
Até
o casarão da viúva
Seria
menor que a minha rua.
Quem
garante que a vida,
Vista
lá de dentro, é tão bela
Quanto
a que enxergo, aqui fora?
Já
faz tempo, não esqueci,
Um
poeta me disse que a solidão
Mora
numa dessas casas
Que
eu nunca entrei.
Quando
anoitece,
Moço,
A
lua, menina silenciosa,
Brinca
lá no alto,
Enquanto
eu estico a minha rede
Aqui
na praça – e sonho,
Sonho
todos os sonhos
Abandonados,
esquecidos na minha rua.