Dora Brisa
Vai, poeta
Beba teu último gole
De melancolia
Mastiga com voracidade
O pão que o diabo amassou
Vai, poeta
Atira pela janela
Tua última esperança
Solta teu
Último escarro
Vai, poeta
Dá a última tragada
Dos teus pulmões
Fala pela última vez
Dos teus medos
Vai, poeta
Derrama tua última
Lágrima inútil
Joga tua parca bagagem
No trem-fantasma
Vai, poeta
Queima tua
Pobre máscara
Veste tua nudez
Com tua última alma
Vai, poeta
Sopra teu
Último sonho
Varre tua
Lembrança mofada
Vai, poeta
Cuspa na fogueira
Que vem das cinzas
Quebra teu único riso
No muro da realidade
Vai, poeta
Fuja das palavras
Enlouquecidas, libertas
(todas as palavras)
Que querem matar o poeta
E tudo o que resta
Corra, poeta
As palavras não querem mais
Saber de mago ou domador
As palavras despertaram:
São mortíferas
Corra, poeta
As palavras não querem rimar
Amor com dor
Criança com esperança
Morte com sorte
Corra, poeta
As palavras se rebelaram
Agitam frases obscenas
Na madrugada
Que o poeta deixou sem lua
Corra, poeta
As palavras querem matar
As rimas, a métrica
A bela melancolia poética
E antes assassinar o poeta
Corra, poeta
As palavras embaralharam
Loucas, embriagadas
Todas carregam uma tocha acesa
E gritam: “Abaixo a poesia que faz o poeta”
Corra, poeta
Não há mais palavras
Estilhaçaram-se todas
Diante de um poema teu
O último poema
(o último gole
o último pesadelo
o último suspiro)
Não adianta mais correr
Poeta
Os estilhaços te atingiram
As palavras viraram cinzas
As mesmas cinzas de que é feita
Tua alma poética.
"Fuja das palavras
ResponderExcluirEnlouquecidas, libertas
(todas as palavras)
Que querem matar o poeta"
Minha qurida amiga Dora Brisa
O poeta não morre...
Assim falei em um soneto:
Tem o seu tempo de extirpar a dor,
Como assobio agudo de um vapor,
Rodopia livre... Nas asas do vento!
Flor.