Foto: Denise
Dora Brisa
A poesia que mais alto canta
Não é aquela pomposa, correta,
Desfilando quase santa,
Nem tampouco a discreta.
A poesia que grita
É aquela que inflama,
Tira tudo do lugar, agita,
Não mostra caminho: clama!
A poesia, que é poesia,
É feita de sede e fome,
Tem cheiro de noite e dia,
Vagueia pelos abismos, some.
A poesia é filha do nada,
Sem herança qualquer.
A poesia é abusada,
Brinca até de se enfeitar, quando quer.
A poesia é bicho selvagem,
Indomada, indomavel,
Crisalida escondida na ferragem,
Longe do admirado, admiravel.
A poesia chega sem nome,
Nem endereço tem,
Sai, por falta de sobrenome,
Volta à solidão de ser ninguém.
A poesia nasce sem necessidade,
Cresce à margem do pensamento,
Faminta, devora o lixo da cidade,
Para, depois, morrer ao relento.
A poesia é coisa antiga,
Podridão reluzindo brilhante,
Velha centenaria desconhecida,
Vestindo roupa nova, elegante.
A poesia não faz sentido,
Por que nasce sem saber,
Vive no espaço escurecido
Do tempo sempre a morrer.
A poesia não é privilegio de ninguém,
Nem mau agouro a quem acredita.
É só a respiração que a alma tem,
Enquanto a vida regurgita.
A poesia não tem sabor,
Nem som, forma, ou cheiro.
A poesia é qualquer coisa entre o pavor
E o extase do mundo inteiro.
Uau! Que belo poema. Para alguém traçar tão belamente sobre a própria arte não pode mesmo ser só mais alguém comum. Tem que ser alguém que é ele mesmo.
ResponderExcluir"A poesia é coisa antiga,
Podridão reluzindo brilhante,
Velha centenaria desconhecida,
Vestindo roupa nova, elegante."
Explicação melhor?
Só o silêncio.
Beijo,
W. Gomes