Dora Brisa
Vi um menino na rua,
Parecia cansado,
Peito aberto - alma nua -,
O mundo tinha carregado.
Parecia cansado,
Peito aberto - alma nua -,
O mundo tinha carregado.
Mas não chorava.
O olhar dele era profundo,
Em tristeza mergulhava.
Pura piedade do mundo.
Não estava ali para ensinar,
Nem mais aprender,
Tão somente um espaço a ocupar,
Numa vida sem porquê.
Não parecia sonhar,
Muito menos esquecer...
Era um menino apenas a vagar,
Na rua - vazia! - a lhe acolher...
Família - há muito ouviu falar.
O barraco - nem sabe onde ficou.
Na vitrine, os olhos a brilhar.
Comida? Só o que do prato restou.
A cada passo, repousa a calma,
Sem mágoas, nem acusação.
Por um momento, abre a alma,
E lhe vêm lágrimas do coração...
Mas ele não enxerga ninguém,
Um ser vivo a quem culpar.
Recolhe a dor que tantos outros têm,
E volta a caminhar...
Ao longe, já não sabe mais o que sente,
Amarra o calçado roto, esconde do short o rasgão.
Num andar torto, por mais que tente,
Continua a chamar atenção...
Desviam dele o olhar,
Outros fogem ainda mais,
Com escárnio, a espiar,
Chamam-lhe estorvo, incapaz...
Atônito, sem compreender,
Foge da esquina - da vida...
Enquanto carrega o corpo a estremecer,
A alma - pura - se vê repelida...
O corpo tomba ofegante,
Já não há brilho no olhar...
A memória busca vida distante,
Um segredo de quem não pôde sonhar...
Aos poucos, se aglomera a multidão...
Tecem comentários - infância perdida!...
Com certeza, um pequeno ladrão...
Drogas, roubo, infração - que vida!...
E, depois de julgarem o que seria o mais correto,
Saem, um a um, voltando a caminhar...
Ninguém mais por perto...
Nem uma sombra a perturbar...
Um corpo desfalecido - ali jaz!
Sem futuro, nem passado... De presente, o caixão...
Partiu sem sequer imaginar a paz,
Na rua onde era visto apenas como um cão...
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