segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Des-vendo-me

Dora Brisa

Faço da tua dor, minha dor...
Do teu cantar, meu olhar a vida...
Do teu medo, meu horror.
Da tua tristeza, minha ferida...
Despojo-me de mim,
Para tocar - de leve - tua alma...
Neste exercício de doação sem fim,
Apercebo-me mais calma...
Já não tenho mais dor,
Nem pensamentos, ou saudade...
Abandono meu temor,
E refugio-me na eternidade...
Nesta busca insana da poesia,
Descrevo teu sentir,
Como tu o escreverias...
E já não te sentes sozinha,
Nem eu tampouco mundana...
És o reto desta linha,
A verdade mais profana...
Enquanto tua vida descrevo,
Apreendo tua visão,
E nesta caminhada me atrevo
A sentir teu coração...
Quanto mais isso faço,
Percebo dentro de mim,
No aprendizado, mais um traço
De quem só quer seguir assim...
De que me valeriam palavras - quimeras -,
Se delas me servisse a bel-prazer,
Sem nada me deixarem a outras eras,
Quando novas lições terei de aprender?
Por isso, o exercício constante,
Da tua alma, minha proximidade...
Tudo discreto, um tanto distante,
Para não ferir tua individualidade...
E quando imaginas que estou por perto,
Não acreditarias se te confessasse:
É o meu momento mais liberto,
Ai de mim, se na vida não brincasse...

Voz - Helena Antoun:

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